Manifestação de Lúpus

Quais são os primeiros sinais de Lúpus?

O Lúpus normalmente começa com uma série de sinais que gradualmente emergem, em poucos dias ou semanas: fadiga, por vezes febre, dores nas articulações, manifestações de pele, dores no peito, falta de ar…
Noutros casos, a apresentação inicial é chamada monossintomática, ou seja, um sinal clínico predomina.
A doença começa frequentemente com atingimento cutâneo, que afeta 50 a 75% dos doentes durante o curso da doença.

Estas lesões cutâneas são estimuladas pela exposição ao sol, ou por vezes simplesmente à luz ultravioleta.
Isto pode incluir:

  • Uma reação excessiva da pele, com vermelhidão tal como uma “queimadura solar”, após uma exposição moderada ao sol: a isto chama-se fotossensibilidade.
  • Vermelhidão em “asas de borboleta” no rosto (ou eritema em “vespertilio”, quer dizer, em asa de morcego). Esta agudização está localizada simetricamente nas maçãs do rosto, nas asas do nariz, e por vezes na testa. Esta vermelhidão pode propagar-se até ao decote e afetar a parte posterior das mãos e antebraços.
    Um Lúpus “discóide”, que provoca uma vermelhidão crónica arredondada, da mesma topografia, acompanhada de escamas (crostas), que infelizmente deixará cicatrizes.
  • Noutros casos, as dores articulares ou “artralgia” estão presentes no início da doença. São dores inflamatórias nas articulações, que interferem com o sono e se caraterizam por uma rigidez dolorosa, especialmente quando as articulações são utilizadas pela primeira vez de manhã. Embora se possa falar de poliartrite (ou reumatismo inflamatório), o inchaço das articulações é mais raro do que na artrite reumatóide. O envolvimento das articulações acontece principalmente nas mãos e pulsos. Ao contrário da artrite reumatóide, esta artrite não é acompanhada pela destruição das articulações. As articulações tornam-se novamente indolores com o controlada doença (ou seja, com remissão) que é favorecida pelos tratamentos.
  • Por vezes a doença pode ser revelada por inflamação que afeta os folhetos que rodeiam o pulmão (pleurisia) ou o coração (pericardite).
  • Noutros casos, a doença pode começar com atingimento renal manifestado pela presença de proteínas (proteinúria) ou glóbulos vermelhos (hematúria) na urina. Esta lesão renal está frequentemente presente assim que o Lúpus é diagnosticado em crianças.
  • Outros sinais de início são possíveis, mas são mais raros: neurológicos, psíquicos, digestivos (pancreatite, hepatite…), cardiovasculares (danos nas válvulas do coração, inflamação do músculo cardíaco, também chamada miocardite, trombose arterial ou venosa, também chamada flebite).
    Face a estes primeiros sinais clínicos, é geralmente a análise de sangue que apontará para o Lúpus sistémico. Praticamente todos os doentes nesta fase têm autoanticorpos, chamados anticorpos antinucleares, em concentrações elevadas. Mais específicos do que os anticorpos antinucleares, os anticorpos anti- DNA nativo contribuem muito para o diagnóstico..

Como é diagnosticado o Lúpus?

Devido à sua elevada heterogeneidade, o Lúpus requer frequentemente uma experiência substancial para ser diagnosticado, considerando todos os aspetos dos sintomas e parâmetros biológicos. Os especialistas utilizarão a sua experiência e critérios de classificação, que foram inicialmente concebidos para fins de investigação científica, para afirmar o seu diagnóstico.

A comunidade científica internacional definiu critérios de classificação que permitem o diagnóstico do Lúpus sistémico. Foram propostas duas classificações principais.

  • A do Colégio Americano de Reumatologia (American College of Rheumatology-ACR), que tem 11 critérios.
    A presença de pelo menos 4 destes 11 critérios torna possível classificar um doente como sofrendo de Lúpus sistémico.
  • Os critérios ACR/EULAR 2000 onde um doente pode ser classificado como Lúpus Sistémico quando alcança uma pontuação de 10 ou mais se o critério de entrada for preenchido.

Que testes são necessários para diagnosticar o Lúpus?

O diagnóstico do Lúpus depende muito das manifestações que revelam a doença. O objetivo dos exames necessários é, por um lado, descartar a possibilidade de uma doença que se assemelharia ao Lúpus e, por outro lado, afirmar o diagnóstico, se possível. Os testes mais úteis para o diagnóstico do Lúpus são:

Exames biológicos de “rotina”

< A procura de uma diminuição dos glóbulos vermelhos no sangue (citopenia): anemia (hemolítica ou inflamatória, diminuição dos glóbulos vermelhos), linfopenia, neutropenia (diminuição dos glóbulos brancos, linfócitos ou neutrófilos), trombocitopenia autoimune (diminuição das plaquetas).

< A pesquisa de lesão renal pela análise da função renal (medida pela creatinina do sangue) e da urina, o que permite saber se existe uma anomalia do filtro renal. Se este filtro for danificado, a urina conterá proteínas (incluindo albumina), mas também glóbulos vermelhos (hematúria) ou glóbulos brancos (leucocitúria). Estas anomalias renais não são específicas do Lúpus, mas são essenciais procurar quando se fala sobre esta doença. Podem ser detetadas através de uma simples análise de urina.

< Os testes da biologia hepática (transaminases, fosfatase alcalina) são especialmente úteis para afastar outra doença (vírus).

Exames imunológicos
< É antes de mais a procura de um elevado valor de imunoglobulinas (hipergamaglobulinemia), que reflete a ativação do sistema imune.

< Os exames biológicos mais importantes para confirmar o diagnóstico são imunológicos com a identificação global de anticorpos antinucleares e seus componentes (ADN anti-nativo, anti-Ro/SS-A e anti-La/SS-B, anti-Sm, anti-RNP) e possivelmente a procura de ativação das proteínas do sistema do Complemento resultando numa diminuição destas proteínas no sangue (chamada hipocomplementemia).

Estes exames imunológicos devem incluir sistematicamente a pesquisa de anticorpos antifosfolípidos. São autoanticorpos que podem “engrossar” o sangue, e levar a um risco de coagulação (trombose) nas veias (chamada flebite) ou nas artérias.

Vários outros exames podem ser úteis, dependendo dos sinais que o doente apresenta

< Pode ser necessária uma biopsia de pele para confirmar, através de análise histológica, o diagnóstico de Lúpus quando confrontado com uma lesão cutânea semelhante à do Lúpus. Mas isto só é útil quando há dúvidas no diagnóstico.

< Em caso de suspeita de lesão cardíaca ou vascular (veia ou artéria), é necessário realizar uma ecografia – Doppler cardíaca.

< Em caso de atingimento renal, deve ser discutida uma biopsia ao rim para se descobrir a gravidade do envolvimento.

< Em caso de atingimento neurológico, é necessário explorar o cérebro através de exames como uma Ressonância Magnética e/ou análise, através de uma punção lombar, o fluido que circula à volta do cérebro (chamado líquido cefalorraquidiano).

< Uma diminuição significativa das células sanguíneas (citopenia) pode justificar um estudo da medula óssea hematopoiética (onde é produzido o sangue) que é colhida sob anestesia local (mielograma).

< As radiografias ou outra técnica de imagem (RM, ultrassons) são por vezes necessárias em caso de dores articulares e/ou ósseas, para excluir outra doença.

A lista de exames necessários em Lúpus não pode ser exaustiva, uma vez que depende da expressão da doença em cada doente num determinado momento da vida. Todos estes exames podem ser necessários para fazer o diagnóstico do Lúpus, mas também, e sobretudo, para definir o tipo e a extensão dos danos em cada órgão e para acompanhar a evolução da doença, para tratar as recaídas o mais rapidamente possível. Esta avaliação é essencial para escolher o tratamento correto.

Qual é a finalidade da pesquisa de anticorpos antinucleares e anticorpos anti-ADN? A definição de um autoanticorpo

Uma resposta “autoimune” (como no Lúpus) pode resultar na produção de anticorpos anormais, chamados autoanticorpos. Estes autoanticorpos são dirigidos contra os constituintes das nossas próprias células, na maioria das vezes localizados no núcleo destas células, daí o termo antinuclear (nuclear = proveniente do núcleo).

Terminologia de autoanticorpos

Estes anticorpos antinucleares são dirigidos contra compostos no núcleo das nossas células, tais como o ADN dos cromossomas (anticorpos anti-ADN nativo), e contra outras estruturas denominadas ribonucleoproteínas, por exemplo anti-Ro/SS-A, anti-La/SS-B, anti-Sm ou anti-RNP. Esta terminologia algo complicada designa ou as letras do nome do doente em que o autoanticorpo foi descrito pela primeira vez (exemplo: Ro, La, Sm), ou a estrutura reconhecida por este autoanticorpo (exemplo: RNP para ribonucleoproteína), ou uma doença associada a este anticorpo (exemplo: SS-A para a Síndrome de Sjögren A).

Como são detetados estes autoanticorpos?

Estes autoanticorpos são detetados no sangue dos doentes através de testes laboratoriais de rotina. A sua deteção é feita em duas fases. Primeiro, uma etapa de rastreio confirma a presença e concentração destes autoanticorpos. Esta concentração é expressa por uma medição das concentrações de titulação sérica (1/80, 1/160, 1/320, 1/1280). Este número significa, por exemplo, que ainda existem anticorpos visíveis num soro que foi diluído 320 vezes: diz-se que este soro é 1/320 positivo. O limiar de positividade varia entre laboratórios, mas geralmente em adultos, é considerado positivo a partir de uma diluição de 1/160.

O segundo passo é identificar o antigénio celular que é visado pelo autoanticorpo. Esta etapa utiliza testes específicos, que detetarão anticorpos contra o ADN nativo, anti-Sm, anti-RNP, anti-Ro/SS-A… Estes testes são realizados em muitos laboratórios.

Utilidade dos autoanticorpos no diagnóstico e prognóstico

Estes autoanticorpos servem como marcadores de diagnóstico, porque na prática a ausência de anticorpos antinucleares exclui a possibilidade de um Lúpus sistémico. No entanto, não são específicos do Lúpus porque podem estar presentes em muitas outras doenças e mesmo em pessoas saudáveis. Estes anticorpos também podem ter valor prognóstico, porque alguns deles atuam diretamente induzindo lesões (exemplo: anticorpos anti-ADN nativo induzem lesões renais).

Como podemos procurar anticorpos anti- ADN nativo?

Os anticorpos anti-ADN são um subgrupo de anticorpos antinucleares detetados por testes de identificação específicos. Estes testes são essencialmente imuno-enzimáticos, chamados ELISA (Enzyme Linked Immuno Sorbent Assay) e teste de Farr. O objetivo destes testes é identificar e quantificar uma reação autoimune desenvolvida contra o ADN dos cromossomas. Este ADN cromossómico é chamado nativo, porque é realmente um ADN “puro”, composto pela famosa dupla hélice. Os verdadeiros marcadores do Lúpus são, portanto, os anticorpos anti- ADN nativo, mas não os anticorpos anti- ADN desnaturado (que são formados por apenas uma hélice). Os anticorpos anti-ADN desnaturado podem ser detetados em muitas circunstâncias, patológicas ou não patológicas, e a sua pesquisa não é útil para o diagnóstico ou tratamento do Lúpus.
Os anticorpos anti- ADN nativo são muito caraterísticos do Lúpus, mas não estão presentes em todos os doentes. Estes anticorpos anti- ADN nativo são excelentes marcadores de diagnóstico do Lúpus, presentes desde o início da doença. No entanto, só são detetados em 60 a 70% dos doentes, em particular quando a doença está ativa. Por outras palavras, você pode sofrer de Lúpus genuíno sem anticorpos anti-ADN nativo. Neste caso, certamente tem anticorpos antinucleares dirigidos contra outras estruturas do núcleo (exemplo: anti-Ro/SS-A e/ou anti-La/SS-B), mas também é possível que o anti- ADN nativo apareça mais tarde, durante o curso da doença.

Os anticorpos anti-ADN nativo podem causar diretamente lesões de Lúpus, por exemplo renais. A sua taxa varia em função da atividade da doença. Estes anticorpos anti-ADN nativo também têm um papel patogénico, porque ao fixarem-se no rim dos doentes, causam glomerulonefrite.

Quanto mais ativa for a sua doença, mais elevados serão os níveis de anticorpos anti- ADN nativo encontrados no sangue. Assim, se tiver Lúpus com anti- ADN nativo, o seu médico utilizará este teste para acompanhar o curso da sua doença.

Porque é medido o complemento sérico? O que é o complemento?

O complemento sérico é um conjunto de pequenas proteínas chamadas C1, C2, C3, C4 (C para complemento) presentes no sangue e nos tecidos. A sua função é regular o sistema imune, facilitando a eliminação de micróbios e detritos celulares, por exemplo, provocados por um vírus. O complemento é de certa forma o “coletor do lixo” do sistema imune. Assim, um defeito do complemento leva a uma “desordem” de detritos.

A desorganização de um sistema imune, particularmente sujeito a estímulos (autoimune), facilita o aparecimento de uma reação autoimune contra os detritos das nossas próprias células, o que amplifica a reação autoimune.

Porque é que o complemento é medido no Lúpus?

O interesse é duplo:

  • Em alguns Lúpus, por razões genéticas, há menos produção de certas frações do complemento (especialmente C4, raramente C1 ou C2).
  • Na maioria das vezes, na prática, os testes de rotina medem as frações C3 e C4, mas também o complemento total, chamado CH50 (complemento hemolítico total). Esta medição torna possível monitorizar a atividade do Lúpus, porque em caso de ativação anormal da imunidade, a taxa de proteínas do complemento (particularmente C3 e C4) está diminuída no sangue.

Assim, uma “hipocomplementémia” por consumo reflete geralmente um período ativo da doença, muitas vezes com envolvimento renal. No entanto, esta hipocomplementémia não é constante, especialmente quando não há envolvimento renal. A medição do complemento é usada rotineiramente para monitorizar o Lúpus.

Existe alguma ligação entre a anemia e o Lúpus?

Sim. O que é a anemia?

A anemia é uma queda dos eritrócitos ou glóbulos vermelhos, que resulta numa redução dos níveis de hemoglobina. A hemoglobina é um transportador de oxigénio que é o constituinte essencial dos glóbulos vermelhos do sangue.

Existem anemias de origens muito diferentes, relacionadas com hemorragias crónicas (por exemplo, devido a menstruações abundantes), deficiência de ferro, inflamação crónica ou destruição excessiva de glóbulos vermelhos.

Como são explicadas as anemias no Lúpus?

No Lúpus, é possível ter anemia por várias razões.

Na maioria das vezes, a anemia é causada pela inflamação devido ao Lúpus sistémico (anemia inflamatória). Esta será corrigida com o tratamento da doença. A anemia mais grave está relacionada com os autoanticorpos antiglobulina. Estes autoanticorpos levam à destruição dos glóbulos vermelhos. É a chamada anemia hemolítica autoimune. Esta hemólise provoca uma descida, muitas vezes bastante brutal e significativa, do nível de hemoglobina. Estes autoanticorpos levam à destruição de glóbulos vermelhos. A isto chama-se anemia hemolítica autoimune. Esta hemólise resulta frequentemente numa queda bastante brutal e significativa do nível de hemoglobina. Este tipo de anemia é bastante raro mas é frequentemente uma emergência que requer tratamentos importantes.

Muitos tratamentos podem levar à anemia através de diferentes mecanismos. É portanto necessário, como regra, considerar sempre uma origem relacionada com medicamentos.

A anemia também pode estar ligada a um defeito de produção de eritrócitos na medula óssea, mas esta forma é excecional. A origem deste defeito de produção está também ligada a uma perturbação do sistema imune. Se a função renal for fortemente prejudicada, a produção de glóbulos vermelhos é reduzida. Este mecanismo não é exclusivo do Lúpus.

Em qualquer caso, a anemia pode não estar diretamente relacionada com o Lúpus, mas pode ser explicada por outro fenómeno associado, tal como hemorragia crónica, deficiência de ferro ou outra anomalia (por exemplo, deficiência de vitamina B12 ou hipotiroidismo). A descoberta de anemia justifica portanto uma entrevista e exame clínico e análises de sangue, para tentar compreendê-la e tratá-la.

O que deve ser feito em caso de anemia?

Em caso de anemia significativa, a causa deve ser tratada o mais rapidamente possível e, em caso de baixa tolerância, deve ser feita uma transfusão de sangue.

O Lúpus pode baixar os meus glóbulos brancos?

Sim. O Lúpus pode baixar os glóbulos brancos.

O que é uma queda de glóbulos brancos (chamada leucopenia)?

Podemos distinguir dois tipos de glóbulos brancos no hemograma:

  • As células polimorfonucleares, que destroem diretamente os micróbios e fazem parte da nossa imunidade inata
  • Os linfócitos, que participam ativamente na resposta imunitária, perturbada no Lúpus. Estes glóbulos brancos podem também tornar-se o alvo da reação autoimune. Isto resultará, portanto, numa diminuição, chamada leucopenia.

O que causa leucopenia no Lúpus?

No Lúpus, a leucopenia mais comum é uma diminuição dos linfócitos, chamada linfopenia. Esta linfopenia, muito comum, é um critério de classificação do Lúpus, mas não é específica porque muitas outras doenças e tratamentos, tais como imunossupressores e corticosteróides, também podem causar esta anormalidade.
Uma diminuição das células polinucleares, chamada neutropenia, também pode ser observada durante o Lúpus, mas precisamos de nos certificar que não existe outra causa mais simples, tal como a deficiência de vitaminas.

A neutropenia está também ligada a fenómenos autoimunes dirigidos contra os glóbulos brancos polinucleares. Uma neutropenia significativa pode facilitar o desenvolvimento de infeções microbianas.

O que deve ser feito em caso de leucopenia?

Na prática, durante a evolução do Lúpus, a maioria das leucopenias (que são na sua maioria linfopenias) não necessitam de qualquer tratamento. Contudo, se o Lúpus causar uma queda significativa em todos os glóbulos brancos, incluindo os neutrófilos polinucleares, e possivelmente outros glóbulos sanguíneos (glóbulos vermelhos e plaquetas), poderá ser necessário tratá-la com um imunossupressor.

Este medicamento visa reduzir a resposta autoimune para permitir que a medula volte a produzir células sanguíneas.

O Lúpus pode baixar as plaquetas?

Sim.

O que é uma queda na contagem de plaquetas (chamada trombocitopenia)?

As plaquetas são pequenas células em forma de disco que circulam no sangue e ajudam a coagular o sangue, quando se juntam como os tijolos de uma parede para bloquear a hemorragia. O Lúpus pode levar a uma queda nas plaquetas, chamada trombocitopenia. Esta trombocitopenia autoimune está frequentemente associada ao Lúpus, e mais raramente a outras doenças autoimunes.

Pode também existir por si só, sob o nome “púrpura trombocitopenia imune”. Esta, às vezes muito importante, trombocitopenia (menos de 10 mil plaquetas / mm3) pode então causar hemorragias geralmente benignas. Estas hemorragias resultam em pequenas manchas roxas na pele, refletindo hemorragias subcutâneas (chamadas púrpura), mas também noutras manifestações tais como hemorragias nas gengivas ou no nariz, ou mais raramente noutros órgãos (hemorragia digestiva ou cerebral). Estas graves complicações hemorrágicas são muito raras durante o Lúpus.

O que causa trombocitopenia no Lúpus?

A trombocitopenia em Lúpus é normalmente explicada por autoanticorpos dirigidos contra plaquetas que têm a capacidade de destruir essas plaquetas.

O que deve ser feito em caso de trombocitopenia?

Apenas trombocitopenia significativa, com uma ameaça hemorrágica, justifica tratamento de emergência, na maioria das vezes incluindo cortisona, mas também por vezes outros medicamentos, tais como imunoglobulinas intravenosas.

Normalmente não é necessário transfundir plaquetas, exceto quando existe um síndrome hemorrágico significativa, ameaçando a vida do doente. No caso de trombocitopenia crónica marcada, com episódios de hemorragia, é por vezes necessário utilizar uma bioterapêutica ou um imunossupressor para além de cortisona e hidroxicloroquina. No passado, quando isto não funcionava, a remoção do baço (esplenectomia) era considerada, mas hoje em dia outros meios médicos são normalmente suficientes. Esta remoção é feita através de uma operação cirúrgica específica.

É possível viver uma vida normal sem baço, porque este órgão, que pode participar na destruição das plaquetas, não é essencial em adultos. Esta remoção do baço requer vacinação específica para assegurar proteção contra certas infeções, incluindo infeções pulmonares (pneumonia pneumocócica), que são mais comuns em pessoas sem baço. Para tal, será vacinado (vacina pneumocócica, meningocócica e Haemophilus e gripe) e, em caso de infeção microbiana, terá de ser tratado muito rapidamente.

Qual é a evolução do Lúpus?

Sem tratamento, o Lúpus progride em agudizações (flares), alternando com fases de relativa calma. Infelizmente, este curso “natural”, sem tratamento adequado, é suscetível de levar não só a danos irreversíveis nos órgãos afetados pela doença, em particular nos rins (insuficiência renal) e no cérebro, mas também pode pôr em risco a vida do doente.

Sob tratamento, o Lúpus evolui normalmente para a “remissão”: desaparecimento dos sinais clínicos e melhoria de certos sinais biológicos, tais como o nível de anticorpos anti-ADN. No entanto, os anticorpos antinucleares permanecem frequentemente presentes, mesmo quando o Lúpus está completamente controlado. O objetivo é manter a “remissão” com uma terapêutica em dose mínima (tratamento mínimo eficaz).

Isto geralmente significa tratamento com antimaláricos sintéticos (como a hidroxicloroquina, cloroquina) a ser tomado vários anos depois de se conseguir a remissão.

A cortisona, e por vezes os imunossupressores, também são prescritos a longo prazo.

Se o tratamento for bem seguido, sem interrupções inoportunas, o risco por crises é menor, e são mais raras. O tratamento precoce e suficientemente intensivo das crises permite limitar consideravelmente as sequelas e evitar um resultado fatal que se tornou muito raro hoje em dia.

As lesões cutâneas do Lúpus podem desaparecer?

Existem três tipos de envolvimento da pele específicos do Lúpus, agravados pela exposição solar:

Lúpus cutâneo agudo, que é uma agudização vermelha que aparece simetricamente no nariz e maçãs do rosto, no decote, ou membros, e é um pouco como uma forma de borboleta, daí o logótipo de muitos grupos de Lúpus, ou como uma máscara de carnaval, parecendo olhos de lobo, daí o nome Lúpus. O Lúpus cutâneo agudo desaparece sem sequelas. Em pele preta, as cicatrizes hiperpigmentadas (mais escuras) podem por vezes permanecer.

Lúpus cutâneo subagudo, que é uma agudização de placa anular ou policíclica. Aparece facilmente nos membros e no tronco. Na maioria das vezes desaparece sem deixar vestígios, mas pode por vezes deixar cicatrizes de pigmento.

Lúpus cutâneo crónico (cuja forma mais comum é o Lúpus discóide). São manchas vermelhas bem definidas com escamas espessas, que se localizam na face, orelhas e couro cabeludo. O centro da agudização cutânea é esbranquiçado e corresponde a tecidos cicatrizados. Este centro esbranquiçado é permanente. No couro cabeludo, leva à queda do cabelo (alopecia) em placas que é frequentemente permanente.

Pode o Lúpus progredir para lesão renal? Como posso ter a certeza de que não tenho lesão renal relacionada com o meu Lúpus?

Sim, o Lúpus pode progredir para lesão renal, mas é bastante raro, exceto em crianças.

As formas de Lúpus com um início principalmente cutâneo e articular são comuns. Provocam danos na pele e dores articulares. Estas formas, se tratadas rápida e adequadamente (geralmente com antimaláricos sintéticos (Hidroxicloroquina, Cloroquina), cortisona em pequenas doses durante um tempo limitado e, se necessário, com metotrexato (adicionado para além do tratamento anterior) podem nunca ser acompanhadas por outras problemas.

A ocorrência de atingimento renal, se não existia inicialmente, é mais rara após vários anos de evolução. Contudo, deve ser procurada regularmente através de um exame de urina porque a lesão renal causada pelo Lúpus não causa inicialmente qualquer sintoma, incluindo nenhuma dor nos rins. Os doentes de pele negra e os doentes asiáticos são mais propensos a desenvolver uma complicação renal.

O envolvimento renal do Lúpus resulta numa inflamação do rim que leva ao aparecimento de proteínas na urina (albuminúria ou proteinúria) e/ou glóbulos vermelhos (hematúria). A procura de albumina e sangue na urina é feita com mais frequência em crianças do que em adultos. Pode ser facilmente feita pelo seu médico de clínica geral ou no hospital utilizando testes instantâneos, sob a forma de tiras que são mergulhadas na urina. Este é um exame de rastreio muito sensível que deve ser feito pelo menos de 6 em 6 meses, e por vezes com muito mais frequência no início da doença, especialmente quando há um elevado valor de anticorpos anti-ADN nativo ou uma diminuição do complemento. As análises de proteinúria realizadas em laboratório numa amostra de urina ou em urina 24 horas são mais precisas.

Assim, se a pesquisa de albumina e/ou sangue for negativa na tira, isso significa que não há lesão renal significativa. Se o exame for positivo, é primeiro necessário verificar se a presença de proteínas e/ou sangue está relacionada com Lúpus através de um exame biológico da urina. De facto, uma infeção banal do trato urinário, ou uma recolha de urina mal feita durante a menstruação, também pode tornar o exame positivo. Se a presença de albumina e/ou sangue estiver relacionada com Lúpus, o seu médico irá sugerir uma biopsia renal, normalmente realizada por punção sob anestesia local e guiada por ultrassons. Dois fragmentos milimétricos são retirados do mesmo rim, e analisados ao microscópio. Em caso de tratamento anticoagulante, a biópsia pode ser realizada através de uma veia do pescoço com um guia que desce até à veia do rim para recolher as amostras (biópsia transjugular), limitando o risco de hemorragia. Em ambos os casos, a biópsia renal não é normalmente um exame muito doloroso (para além do inconveniente da anestesia local), uma vez que não existem nervos no interior do rim. Há um baixo risco de hematoma renal após a biópsia.

Este passo essencial permitirá a análise do seu rim ao microscópio e determinará a magnitude do atingimento renal. Uma vez que a lesão renal é difusa, ou seja, espalhada por todo o rim, uma biopsia de alguns milímetros fornece informações sobre o estado geral dos 2 rins.

A presença de albumina na urina durante o Lúpus pode ser o resultado de um envolvimento renal ligeiro, que pode não danificar os rins, ou lesões graves que podem levar à insuficiência renal na ausência de tratamento eficaz. A biopsia aos rins é, portanto, fundamental para orientar o tratamento.

Como progride a nefrite lúpica (envolvimento renal)?

Cerca de 20-40% dos doentes adultos com Lúpus e 30-80% das crianças desenvolvem lesões renais. Isto é mais comum em asiáticos e doentes de ascendência africana do que em caucasianos.

O resultado da biopsia renal definirá a gravidade deste envolvimento renal e ditará em grande parte o tratamento necessário para o controlar. As formas graves de nefrite lúpica (chamadas proliferativas) justificam um tratamento que combina corticosteróides em doses inicialmente elevadas (prednisona: 0,5 a 1 mg / kg / dia) e tratamento imunossupressor (micofenolato mofetil ou ciclofosfamida) para além de hidroxicloroquina, o que reduzirá a inflamação renal.

Esta estratégia terapêutica torna quase sempre possível melhorar as lesões renais do Lúpus, muitas vezes até para as curar, ou pelo menos para as estabilizar. O benefício é sobretudo visível a longo prazo. Por esta razão, é importante continuar a terapêutica imunossupressora por um longo período de tempo (pelo menos 2 anos).

Por vezes é necessário realizar uma biopsia renal de controlo após alguns meses para verificar a eficácia do tratamento. Se tiver tensão arterial elevada, ou se persistir uma proteinúria significativa mesmo sem hipertensão, ser-lhe-á prescrito um medicamento que reduz a tensão arterial e a pressão nos filtros renais, para reduzir a fuga de proteínas para a urina e para proteger o rim (a isto chama-se “nefroproteção”).
Existe ainda um risco de recaída que requer uma monitorização regular e o uso continuado da hidroxicloroquina, mesmo que a terapêutica imunossupressora possa ter sido interrompida.

Raramente, apesar de todos estes tratamentos, as lesões renais podem continuar a agravar-se, levando gradualmente à necessidade de transplante renal ou diálise (a isto chama-se falência renal ou “em fase avançada” para dizer que os rins já não desempenham de todo as suas funções de purificação filtração?).

Como é que o Lúpus evolui nas crianças?

Na maioria das vezes, o Lúpus que começou na infância continua ativo até à idade adulta e requer tratamento e supervisão médica. Os tratamentos atuais geralmente ajudam a controlar bem o Lúpus.

Menos frequentemente, os sintomas desaparecem, mas não sabemos se é possível curar permanentemente o Lúpus sistémico.

Devemos antes chamar-lhe remissão prolongada, e é sempre necessário um controlo regular.

O meu médico pode saber se o meu Lúpus vai ser grave ou não?

Não. É difícil prever com certeza o curso do Lúpus. O conhecimento da doença ensinou-nos que existem formas “benignas”, que não têm complicações mesmo após muitos anos de progressão, e que existem formas mais “graves”. Há elementos objetivos que caraterizam estas duas formas, mas nenhum que torne possível prever com certeza o futuro.

É por esta razão que é útil obter um bom acompanhamento médico ao longo do curso da doença.
Independentemente da gravidade inicial, a gestão desta doença é muitas vezes muito eficaz. As formas refratárias (aquelas que não respondem bem aos tratamentos) são raras. Além disso, os recentes avanços terapêuticos permitiram o desenvolvimento de muitos medicamentos novos, que oferecem esperança de uma solução mesmo nas situações mais difíceis.

O Lúpus pode ser curado?

Em rigor, não há hoje nenhum tratamento que erradique o Lúpus “para sempre”, mas na maioria dos casos, é possível tratar o Lúpus de tal forma que a pessoa possa viver uma vida normal, com um Lúpus que esteja “adormecido” por períodos prolongados. Em alguns casos, o Lúpus pode “desaparecer” espontaneamente, em particular no período posterior à menopausa, mas não em todos os casos. Contudo, nenhum médico se pode comprometer a “curar” o Lúpus sistémico hoje em dia, porque os tratamentos existentes, incluindo as bioterapêuticas modernas, têm como principal objetivo controlar a doença. Hoje em dia, não existe nenhum tratamento que corrija o gatilho inicial do Lúpus “uma vez e para sempre”.

De facto, existem dois “graus” de cura que precisam de ser distinguidos:

O desaparecimento sustentável (ao longo de vários anos) de todos os sintomas quando os tratamentos foram interrompidos (primeiro parar os corticosteroides, depois a hidroxicloroquina). Isto é bastante comum por volta dos 50-55 anos de idade; isto é, após a menopausa.

Também são descritas recuperações anteriores, especialmente após tratamento imunossupressor. Como precaução, falamos de remissão prolongada, porque os anticorpos antinucleares permanecem frequentemente no sangue. A sua negatividade duradoura, constituindo uma “cura real”, é possível mas muito mais rara.

Na maioria dos casos, o tratamento ajudará a manter a doença a um baixo nível de atividade, eliminando a maior parte dos seus efeitos. Mas um acompanhamento regular, uma adesão cuidadosa ao tratamento continuado, e medidas de precaução, tais como evitar a exposição solar, continuarão a ser da maior importância.

Qual é a relação entre Lúpus e fadiga?

A fadiga é geralmente notificada durante a maioria das doenças crónicas. Afeta quase 9 em cada 10 doentes com Lúpus.

A fadiga corresponde a uma diminuição do desempenho da atividade física e mental. Pode dificultar a vida quotidiana, impedindo a realização de certos projetos, e pode dificultar as relações sociais. Este é o sintoma que é considerado o mais incapacitante por metade dos doentes. Quando o Lúpus está ativo, a fadiga está diretamente relacionada com a doença, especialmente se a doença causar dor ou inflamação intensa.

Por outro lado, quando o Lúpus parece estar sob controlo, a causa da fadiga não é bem conhecida.

Vários fatores estão envolvidos: o nível de desempenho muscular (fraqueza muscular induzida pela toma prolongada de cortisona, perda da condição física), a possível associação com fibromialgia e distúrbios do sono aponta por vezes para um estado depressivo.

Fadiga: um sinal de atividade Lúpus, mas não só. Outras causas de fadiga orgânica, como a anemia, ou disfunção da glândula tiróide, devem ser corrigidas.

A fadiga é muitas vezes um reflexo da atividade da doença. As dores persistentes nas articulações ou músculos e a preocupação com a atividade da doença, que podem causar perturbações do sono, são todas causas possíveis de fadiga relacionada com o Lúpus. No entanto, a fadiga persiste por vezes apesar de um bom controlo da doença, o que sugere a existência de outros fatores.

Estes podem incluir:

Uma doença autoimune associada ao Lúpus, incluindo a disfunção da tiroide (hipo ou hipertiroidismo), miastenia gravis ou síndrome de Sjögren (que por vezes provoca perda urinária de potássio ou fósforo).

A fibromialgia, que está presente em cerca de 15 a 25% dos doentes com Lúpus, também pode ser uma parte importante da fadiga

Anemia, cujas causas são múltiplas. A fadiga é então acompanhada de falta de ar.

Insuficiência adrenal após a interrupção da terapêutica prolongada com corticosteroides.

Problemas hormonais: a fadiga acompanha frequentemente as dificuldades de ovulação e depois ocorre mais na segunda parte do ciclo: muitas mulheres sentem-se exaustas na véspera do seu período.

Uma doença não relacionada com o Lúpus, incluindo uma infeção.

Os fatores psicossociais estão frequentemente associados, tal como em muitas doenças de longa duração

A ansiedade está frequentemente presente e pode persistir, mesmo fora de qualquer agudização da doença.

Por vezes os estados depressivos estão presentes e podem traduzir-se num estado de fadiga crónica, que é isolado. É então necessário rastrear o hipotiroidismo. Em situações de fadiga dita “nervosa”, é a ansiedade ou a tensão nervosa que lhe permite aguentar-se. A depressão cansa, mas a ansiedade por vezes ajuda a manter-se de pé. Neste caso, quanto mais cansado estiver, mais luta contra a exaustão, usando as suas reservas e usando estimulantes como o café. A fadiga também pode ser a consequência de stress excessivo, como mecanismo de adaptação.

O cansaço que persiste após a agudização do Lúpus tem frequentemente várias causas

A ansiedade ou depressão podem resultar da preocupação com a sua doença.

O stress diário ligado à sociedade moderna impondo uma corrida incessante: trabalho (horários, stress profissional, medo de despedimento), transportes públicos, restrições familiares, hiper ligação a e-mails, textos…

Os medicamentos e a própria doença também podem estar em jogo.

Que fases psicológicas poderei passar à medida que o Lúpus evolui?

O diagnóstico pode demorar muito tempo em algumas pessoas porque o Lúpus é tão complexo e imita tantas outras doenças possíveis. Ao passar o tempo, algumas pessoas podem ficar tão frustradas pela ausência de um diagnóstico enquanto suportam dor, fadiga e muitos outros sintomas, que o nome de uma doença vem como um alívio.

Para a maioria das pessoas, contudo, receber um diagnóstico de “Lúpus eritematoso sistémico” é uma experiência difícil. Esta pode ser a primeira vez que ouvem o nome desta doença e a variedade de sintomas que podem enfrentar explicados. Esta dificuldade é agravada pelo aspeto crónico da doença, a má reputação de alguns dos componentes do tratamento, e a não ajuda das redes sociais. No entanto, não há outra opção para eles a não ser começar a sua jornada de vida com Lúpus.

A maioria irá primeiro enfrentar um período de “negação”: porquê eu? O que fiz eu de errado? Não é possível que eu tenha esta doença, tem a certeza de que não é outra coisa? Para alguns, este será um período de raiva e depressão. Uma vez aceite esta realidade, passarão frequentemente à fase de “despertar”, durante a qual começarão a compreender a doença e o seu tratamento, muitas vezes centrados nas limitações e ameaças causadas pelo Lúpus. Para a maioria, com o tempo, a compreensão da doença tornar-se-á mais completa e mais equilibrada. Esta é a fase de “adesão”. Aceitam que o Lúpus está na sua vida, que não é por sua “culpa”, e concentram-se em minimizar o seu impacto, criando rotinas para ajudar a combatê-lo ou a lidar com os seus efeitos. Finalmente, vários doentes atingem a fase “eudemónica”, onde o Lúpus se torna uma parte integrante e “positiva” da sua vida.

Não há tempo fixo para experimentar estas fases psicológicas. O apoio social positivo, a educação do doente, a participação em discussões com outros que vivem com Lúpus, o diálogo aberto com o médico ou a equipa multidisciplinar para o Lúpus, e por vezes o apoio psicológico, podem ajudar as pessoas a moverem-se, cada uma ao seu próprio ritmo, através das várias fases psicológicas da vida com Lúpus. Pode haver recaídas, momentos de desespero e frustração acerca da doença, isto também é normal e acontece com a maioria das pessoas que vivem com uma condição crónica.

As crises podem criar um regresso temporário a uma fase psicológica anterior, mas a experiência de estar envolvido na gestão da doença continua a ser uma vantagem para viver melhor com a realidade.

Tenho dores por todo o lado, será por causa do Lúpus?

A dor causada pelo Lúpus tem várias causas. No Lúpus, existe frequentemente dor articular (artralgia ou artrite) e dores musculares (mialgia ou miosite). Estas perturbações articulares e musculares são inflamatórias e, na maioria dos casos, são muito bem aliviadas por tratamentos anti-inflamatórios ou mesmo imunomoduladores. Também são possíveis dores no peito aumentadas pela respiração: correspondem à inflamação do pericárdio ou da pleura que envolve o coração e os pulmões respetivamente; estas dores são atenuadas sob tratamento apropriado.

A dor pode ser difusa e angustiante, sem relação com a inflamação, sugerindo fibromialgia associada ao Lúpus.

Por vezes os doentes queixam-se de dores mais difusas, com a impressão de que “tudo dói”. Estas dores estão frequentemente associadas a grande fadiga e dificuldade em lidar com as tarefas diárias, por vezes com outros sintomas, tais como distúrbios de concentração e memorização.

Quando confrontados com este tipo de manifestação, devemos primeiro assegurar-nos de que não há inflamação devida ao Lúpus. Na ausência de qualquer anomalia, é então necessário considerar uma “perturbação” do controlo da dor pelo cérebro.

Esta perturbação é frequentemente denominada “fibromialgia”. A fibromialgia associada ao Lúpus não a/0 expõe a qualquer risco particular de dano ou destruição de um órgão, mas as dores sentidas pelo doente podem ser particularmente angustiantes, devido à sua natureza de longa duração e à eficácia limitada dos medicamentos contra a dor. É importante estar tranquilo e não aumentar o tratamento com cortisona ou imunossupressores para este tipo de dor, uma vez que serão ineficazes. No entanto, o uso de medicamentos prescritos para a depressão, ou epilepsia, podem aliviar a dor.

A ajuda de um psicólogo e psiquiatra também é por vezes benéfica, assim como os cuidados físicos fisioterapêutica?

Por vezes a dor difusa pode estar relacionada com a paragem da cortisona de forma demasiado abrupta. De facto, quando o corpo está “habituado” a tomar cortisona, as glândulas suprarrenais (que normalmente produzem cortisona no nosso corpo),deixam de a produzir.

Assim, a cessação abrupta (deve ser absolutamente evitada) de qualquer toma de corticoides causará dor (especialmente dores musculares, por vezes no abdómen) e grande fadiga, porque o corpo não foi capaz de retomar a produção de cortisona “endógena” com a rapidez suficiente. O seu médico será capaz de fazer o diagnóstico rapidamente e sugerirá com urgência a toma de uma dose adequada de cortisona.

No caso de gastroenterite “benigna”, se não conseguir tomar a cortisona oral , esta deve ser dada por via injetável durante um dia ou dois. O mesmo se aplica no caso de uma cirurgia que exija o jejum.

As minhas articulações doem, existe algum risco de deformação das mãos?

A maioria do Lúpus dá dores articulares (artralgia), mais raramente inchaço articular (artrite). Normalmente, não há deformação articular no Lúpus, mas várias anomalias podem ser observadas.

Artrite

Inchaço das articulações que desaparece com o tratamento. O inchaço doloroso das articulações, na maioria das vezes dos dedos, acompanhado de rigidez matinal está relacionado com a inflamação (artrite). Desaparecem rapidamente com os tratamentos para o Lúpus.

Artropatia de Jaccoud
Raramente podem aparecer deformidades relacionadas com um deslocamento dos tendões dos dedos. Estas deformidades assemelham-se às da artrite reumatóide, mas não estão ligadas a uma destruição dos ossos da articulação. Apenas os tendões são afetados, e a deformação pode ser reduzida na fase inicial.

Este tipo de deformação chamada “mão de Jaccoud” não reflete uma atividade real de Lúpus. Requer cuidados com exercícios de reabilitação, o uso de apoios ortopédicos à noite e, talvez, cirurgia .
Excecionalmente, o Lúpus pode estar associado à artrite reumatóide (adulto) ou à artrite idiopática juvenil (infância).

Esta associação é por vezes chamada “rhupus”: “rh” para a artrite reumatóide e “upus” para o Lúpus. Neste caso, os danos articulares observados podem ser os mesmos que na artrite reumatóide, com erosões, e por vezes destruição não redutível das articulações afetadas.

Será gerida da mesma forma que a artrite reumatóide, muitas vezes com excelentes resultados para prevenir o risco de destruição das articulações.

Os meus dedos por vezes tornam-se “todos brancos”, será este o fenómeno de Raynaud? Qual é o papel do Lúpus?

O fenómeno ou síndrome de Raynaud, é um distúrbio transitório da circulação sanguínea nas extremidades, afetando os dedos das mãos, por vezes os dedos dos pés, e mais raramente o nariz ou as orelhas. Pode ser agravado por certas medicamentos com atividade vasoconstritora, ou seja, fazendo com que as artérias das extremidades se contraiam.

Os sinais aparecem em episódios, durante os quais os territórios cutâneos afetados ficam subitamente brancos (fase sincopal) (ver foto adjacente) e ficam “adormecidos” antes de passarem por uma fase purpúrea (fase asfixiante) e depois ficam vermelhos (fase hiperémica, indicando o retorno da circulação nos vasos que relaxam). Formigueiro doloroso, pulsações e entorpecimento, com ou sem perda de sensibilidade, estão frequentemente associados.

É comum na população em geral (uma em cada 10 pessoas), sendo encontrada mais frequentemente no Lúpus (cerca de 20 a 30 em cada 100 doentes) onde permanece benigno, e sem consequências.

Quais são os fatores desencadeadores?

Na maioria das vezes, este fenómeno é desencadeado por uma exposição ao frio que leva à vasoconstrição (aperto de pequenos vasos por contração exagerada da sua parede).

Outros fatores desencadeadores são conhecidos: emoção intensa, stress, vibrações (manuseamento repetitivo e regular de ferramentas mecânicas vibrantes, tais como martelo pneumático). Este fenómeno é agravado pelo tabaco.

Tenho os olhos secos e a boca seca, será por causa do Lúpus?

Um síndrome seco pode evocar uma doença autoimune das glândulas secretoras (exócrinas): Síndrome de Sjögren. Um “síndrome seco” é bastante comum no Lúpus. Mais de um terço dos doentes com Lúpus queixam-se de boca seca e/ou olhos secos. Esta secura está ligada a uma inflamação autoimune das glândulas que produzem saliva (glândulas salivares) e lágrimas (glândulas lacrimais). Uma biópsia destas glândulas (salivares) pode ser feita para o diagnóstico de síndrome seco. Neste caso, a biópsia mostra um infiltrado de células (linfócitos) nas glândulas. Este infiltrado é classificado de acordo com a sua intensidade (classificação de Chisholm e Mason). Apenas um infiltrado linfocitário significativo tem valor diagnóstico.

Este síndrome autoimune seco, chamado síndrome de Sjögren, pode estar associado ao Lúpus, mas também a outras doenças autoimunes, tais como a artrite reumatóide.

A menopausa e certos medicamentos (anti-histamínicos para alergias e antidepressivos, por exemplo) também são suscetíveis de causar secura.

Como deve ser gerido este síndrome seco?

O aparecimento do síndrome de Sjögren no Lúpus não reflete a atividade da doença. Não há cura para este síndrome e, por conseguinte, só podemos aliviar os seus sintomas, com o uso de lágrimas e gel lacrimogéneo, saliva artificial e medicamentos que estimulam as secreções (cloridrato de pilocarpina).

Em caso de secura grave, pode ser útil ter o parecer de um oftalmologista para verificar que não há complicações oculares (queratoconjuntivite seca).

Assegurar cuidados dentários regulares é essencial, porque a ausência de saliva reduz as defesas naturais dos dentes que correm o risco de serem danificados.

A minha queda de cabelo está relacionada com o Lúpus?

A perda de cabelo (em termos médicos “alopecia”), geralmente espalhada por todo o couro cabeludo, acompanha por vezes a atividade do Lúpus. Regride sem sequelas com o tratamento geral da doença. Mas o recrescimento é lento. Por outro lado, quando o Lúpus discoide leva a áreas localizadas de alopecia, o recrescimento é incerto. Se a queda de cabelo ocorrer fora de uma agudização do Lúpus, outra causa deve ser procurada. Esta pode ser secundária a um medicamento (imunossupressor), deficiência de ferro ou de vitaminas, mau funcionamento da tiroide, excesso de testosterona (hiperandrogenismo), uma situação stressante ou, por vezes, estilo de cabelo (cabelo entrançado com alopecia de tração).

Finalmente, um aumento da queda de cabelo é comum em todas as mulheres no semestre seguinte ao parto. Não é, portanto, durante este período, sinónimo de atividade Lúpus.

Tenho dificuldade nas digestões, será por causa do Lúpus?

Na maioria dos casos, as perturbações digestivas não estão relacionadas com o Lúpus. O trato digestivo é raramente afetado durante esta doença. Os distúrbios digestivos estão mais frequentemente relacionados com medicamentos, tais como a toma de anti-inflamatórios, antimaláricos sintéticos ou imunossupressores. Pode haver azia, náuseas, dores abdominais, má digestão, ou mesmo diarreia. Alguns sintomas são temporários, especialmente os relacionados com a toma de antimaláricos sintéticos, que desaparecem espontaneamente após algumas semanas de tratamento. Noutros casos, a azia pode justificar uma endoscopia gastroduodenal, para assegurar a ausência de inflamação ou uma úlcera da mucosa.

O stress, a ansiedade, o tabaco e o álcool são também causas comuns de distúrbios digestivos. excecionalmente, pode ocorrer envolvimento vascular por inflamação ou trombose dos vasos digestivos. Nestas situações, os doentes descrevem então “cólicas” no abdómen durante a digestão. Pode também ser colopatia funcional (“intestino irritável”), como observado na população em geral.

As minhas frequentes dores de cabeça estão relacionadas com o Lúpus?

Raramente estão diretamente relacionadas com a atividade da doença. No entanto, os doentes com Lúpus queixam-se frequentemente de dores de cabeça. Na maioria das vezes, trata-se das chamadas dores de cabeça de “tensão” causadas pelo stress e não diretamente relacionadas com o Lúpus (exceto no stress poder estar relacionado com ter uma doença crónica).

Por vezes são enxaquecas unilaterais e por vezes precedidas por perturbações visuais, ou sinusite não relacionada com o Lúpus. Raramente, as dores de cabeça podem ser indicativas de uma complicação especificamente devida ao Lúpus, tal como um acidente vascular cerebral (AVC) ou tensão arterial elevada. Nestes casos, as dores de cabeça resistem (ou são resistentes) aos tratamentos habituais para a dor, persistem durante vários dias e são frequentemente acompanhadas por outros sintomas. É necessário consultar rapidamente o seu médico que, após um exame clínico detalhado, avaliará a necessidade de realizar exames neurológicos adicionais (TAC ou ressonância magnética cerebral).

Pode a flebite ou a embolia pulmonar estar relacionada com o Lúpus?

Sim. Mas na maioria das vezes é ao síndrome antifosfolipído associado ao Lúpus que deve ser atribuída a culpa. Este síndrome é uma doença autoimune caraterizado pela formação de coágulos de sangue na rede venosa (flebite) ou arterial. No caso de flebite, deve-se procurar estes anticorpos antifosfolípidos, porque a sua presença requer uma terapêutica anticoagulante prolongada.

Tive um AVC, será por causa do Lúpus?

É raro. Um AVC relacionado com um coágulo que obstrui uma artéria no cérebro (trombose) pode complicar o Lúpus. Esta trombose geralmente revela um síndrome antifosfolípido associado ao Lúpus, mas também uma possível aterosclerose acelerada (desenvolvimento de uma placa de ateroma que pode descolar e entupir uma artéria no cérebro). A prevenção de recaídas baseia-se num tratamento anticoagulante prolongado que visa um RNI (relação normalizada internacional) entre 2 e 3, ou mesmo entre 3 e 3,5 no contexto do síndrome antifosfolípido.

Se este AVC for devido a aterosclerose, será gerido como um AVC regular, visando os fatores de risco vascular e a prescrição de agentes antiagregantes. Por vezes é difícil diferenciar do AVC que afeta a população em geral (complicação da aterosclerose).

O Lúpus pode causar grandes gânglios linfáticos?

Sim. Os gânglios linfáticos podem aumentar de tamanho (adenomegalia ou linfadenopatia) quando o Lúpus está ativo. São gânglios linfáticos inflamatórios que não merecem tratamento especial. Eles traduzem a ativação do sistema imune que acompanha a agudização da doença e regridem com o seu controlo. Alguns podem, contudo, persistir com o tempo.

No entanto, a linfadenopatia pode ser vista noutras doenças, infeciosas ou tumorais, justificando uma avaliação específica. É por vezes necessário remover cirurgicamente um destes gânglios, a fim de o analisar ao microscópio, em particular para procurar micróbios.

 

Fonte: Lúpus100