“Posso fazer uma vida normal, com os devidos cuidados e vigilância”

Mais do que podermos explicar o que é o Lúpus e como pode viver com a doença, é importante ouvir a realidade de outros doentes que passam pela mesma situação de ter sido diagnosticado com Lúpus. Rita Jorge é uma doente com Lúpus, tem 42 anos, e no XII Encontro da Associação, que teve lugar no dia 26 de Maio, deu o seu testemunho. Como foi receber o diagnóstico, encarar uma nova vida e saber que a doença que tem não tem cura. Mas o optimismo e a força venceram e Rita Jorge foi mãe e tem hoje uma vida controlada e “normal”, segundo a mesma.  Deixamos-lhe a sua história.

Testemunho de Rita Jorge, 42 anos, doente com Lúpus

Fui diagnosticada com lúpus em 2002, tinha então 26 anos. Foi uma mancha vermelha na cara, em forma de borboleta, que não passava que me levou ao Dermatologista, mas na verdade já tinha outros sintomas que não relacionei, tais como dores articulares, inflamação à volta das unhas, cansaço extremo e falta de apetite.
Na data da consulta as manchas já se tinham espalhado pelo peito e a Dermatologista fez-me uma biópsia à pele na zona do decote que confirmou a sua suspeita mal me viu: LES – Lúpus Eritematoso Sistémico. Senti o meu mundo a desabar. Julgava que tinha uma simples alergia e menosprezei os outros sintomas e não estava nada preparada para aquele diagnóstico. Só conhecia a doença de nome, tinha a ideia que era grave mas na verdade não sabia o que era. A Dermatologista explicou-me que de facto podia ser grave mas controlável. Receitou-me um anti palúdico, o Plaquinol e uma pomada à base de corticoides para colocar nas lesões cutâneas. Avisou-me para evitar a exposição solar e encaminhou-me para um médico internista do Hospital de Santa Maria (HSM).

Já no HSM foram-me feitas análise ao sangue que corroboraram o diagnóstico e comecei também a tomar corticoides uma vez que as manchas, as dores articulares, o cansaço e a falta de apetite estavam cada vez piores. Começou-me também a cair bastante cabelo. Nessa altura, chamaram ao hospital os meus pais e a minha irmã para explicarem a minha doença e para lhes fazerem análises e despistar a existência da doença. Felizmente nenhum deles acusou nada relacionado com LES.
Foi-me explicado que os raios ultra violetas eram muito perigosos para doentes com LES e passei a ter muito cuidado com o sol. Nos primeiros tempos quase não pus os pés na praia e habituei-me a utilizar protetor solar com índice 50, faça chuva ou faça sol.
O cansaço e o stress são outros inimigos a evitar. Tento descansar e evitar o stress, não é fácil porque sou uma pessoa muito ansiosa.
O tabaco também é muito prejudicial e eu fumava cerca de um maço por dia, mas não deixei. Fui encaminhada para as consultas de cessão tabágica de Pneumologia e só parei de fumar em 2008.
As consultas de Medicina Interna e as análises passaram a fazer parte da minha rotina, com uma periodicidade que dependia dos resultados das análises e das minhas queixas. Fiz psicoterapia durante 3 anos também no HSM.
Até 2008 andei relativamente bem, com altos e baixos, tive períodos que nem necessitei de corticoides. Em Abril de 2008 tive um enfarte agudo do miocárdio e fui submetida a uma angioplastia de emergência. Foi nessa altura que deixei de fumar. Passei a ser seguida em Cardiologia no mesmo Hospital e à medicação habitual acrescentei aspirina 100, medicação para controlar a tensão e o colesterol.
No final desse ano comecei a acordar com os olhos, as pernas e as mãos inchadas um mau estar geral, contactei o “meu médico do lúpus” (Medicina Interna) que ao observar-me e ouvir as minhas queixas me pediu análises que demonstraram que algo de muito errado se passava com os meus rins. Fui encaminhada para Nefrologia onde me fizeram uma biópsia renal. Resultado: nefrite lúpica. Fiz um tratamento com ciclofosfamida e doses elevadas de cortisona. O tratamento provocava-me náuseas e muito mau estar, fiquei desfigurada com as doses elevadas de cortisona, as consultas e análises eram quase semanais, mas nunca deixei de trabalhar. Foi uma fase muito complicada mas reagi bem ao tratamento. Desde então passei a ser seguida também em Nefrologia e a tomar diariamente imunossupressores.
Ao aproximar-me dos 40, e uma vez que a doença se mantinha estável, comecei a ponderar engravidar. Falei com os médicos que me seguiam, que me encaminharam para as consultas de alto de risco de Obstetrícia no HSM. A medicação foi ajustada e em 2016 engravidei. A gravidez decorreu lindamente, sob apertada vigilância médica, muitas análises e ecografias. No final de novembro nasceu o Tiago de parto natural. Apesar do pós parto ser um período física e emocionalmente muito exigente o LES manteve-se em remissão e amamentei até aos 9 meses.
Uma relação de confiança com os médicos é muito importante. Os profissionais que me seguem sempre me transmitiram que posso fazer uma vida normal, com os devidos cuidados e vigilância e é essa mensagem que gostaria de deixar aos restantes doentes com lúpus. Ter lúpus não é o fim do mundo. Com a medicação certa, consultas e análises regulares julgo que tenho qualidade de vida e não me sinto limitada nem me defino por ter LES.